
Foto: Jornalista Fabio Marques
O Corregedor Nacional de Justiça, Ministro Humberto Martins, e o Juiz Auxiliar da Corregedoria Nacional de Justiça, recebeu no Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO), na tarde desta segunda-feira (18/11), o advogado Dr. Jales Java dos Santos Lacerda Caliman (Dr. Java) e o repórter do Valle Notícias, Carlitos Delfino.
Os dois fizeram uma solicitação ao ministro para que o inquérito que foi instaurado no Ministério Público de Ceres para apurar possíveis crimes praticado por agentes prisionais, supervisores e diretores passa a ser investigado pela Corregedoria Nacional de Justiça devido às gravidades dos possíveis crimes de torturas, tentativa de homicídio, estupro, ameaça, prevaricação e outros, que supostamente tenham ocorridos na Unidade Prisional de Ceres no período de 2013 até meados de 2019. Neste período vários reeducandos foram possivelmente vítimas de crimes de torturas e outros, e seis ficaram gravemente feridos - todos entre 20 e 35 anos de idade.
Gravíssimos relatos dos reeducandos e seus familiares sobre os possíveis crimes de tortura, tentativa de homicídio, estupro, ameaça, abuso de autoridade e outros crimes brutais de violações aos direitos humanos por eles sofrido. Estes relatos foram entregues em mãos ao Ministro Humberto Martins através de documentos, fotos e vídeos
No dia 22/07/2018, o Promotor de Justiça Marcos Alberto Rios, titular da 2ª Promotoria de Ceres, instaurou inquérito civil público a partir de provocação recebida do Ministério Público Federal, ouvidoria Nacional dos Direito Humanos do Estado de Goiás, que teve por objetivo a apuração de crimes de tortura praticados na Unidade Prisional de Ceres.
No decorrer das investigações ao menos dois diretores, dois supervisores e cerca de oito agentes prisionais foram afastados de suas funções.
Após começar as investigações para apurar possíveis crimes de tortura, tentativa de homicídio, prevaricação, abuso de autoridade e corrupção e outros praticados possivelmente por agentes prisionais, supervisores e diretores da Unidade Prisional de Ceres, o Promotor de Justiça Marcos Rios que estava investigando o caso passou a sofrer todos tipos de ameaças, inclusive de morte.
“O que a gente evidenciou foi uma possível existência até mesmo de uma organização criminosa que possivelmente estariam agindo dentro e fora da unidade”.
Familiares dos presos que prestaram depoimento ao Ministério Público alegam que passaram a ser perseguidos e até torturados. Relataram ainda que alguns presos foram transferidos da Unidade Prisional de Ceres para outro presídio sem nenhum motivo aparente e foram colocados em uma cela de isolamento por 120 dias onde passaram por sessões de torturas e ainda foram privados das visitas de familiares e que reeducados que prestaram depoimento ao Ministério Público foram ameaçados de morte chegando até mesmo a sofrer tentativa de homicídio.
Devido à gravidade da situação que se encontra as investigações no Ministério Público de Ceres, Carlitos Delfino e o advogado Dr. Java levaram o caso ao conhecimento do Corregedor Nacional de Justiça, Ministro Humberto Martins para que seja tomada as devidas providências.
De acordo com que apurou Carlitos Delfino e Dr. Java, pelo menos 70 pessoas, a maioria reeducados na Unidade Prisional de Ceres, restou reconhecida a possível prática de tortura física, psicológica e mental, bem como duas tentativas de homicídio, entre elas, o caso do reeducando Walisson Nathan Pereira dos Santos que foi torturado por diversas vezes e sofreu tentativa de homicídio supostamente praticada por três agentes prisionais.
As principais provas são as lesões nos presos, muitos com feridas de marca de tiros de bala de borracha, fraturas pelo copo e mutilações devido às atrocidades praticadas pelos supostos torturadores. Grande parte das agressões foram cometidas quando os detentos estavam algemados com as mãos para trás, agachados e de costas para os agressores.
As práticas possuem uma estreita ligação com técnicas desenvolvidas no período do regime militar as quais eram usadas para torturar presos. Supõe-se que essas técnicas foram trazidas a partir do dia em que a direção da Unidade Prisional assumiu o controle da cadeia de Ceres e eram colocadas em prática por diretores, supervisores e alguns agentes prisionais que trabalharam na unidade no período de 2013 até meados de 2019.
Alguns reeducados relataram ao Valle Notícias que já estiveram presos na unidade quando era administrada pela Polícia Civil e todos disseram que nesta época os reeducados eram tratados com respeito e dignidade.
De acordo com as denúncias narradas com riqueza de detalhes ao Valle Notícias, as torturas dentro da unidade – cada qual com um nome específico – foram praticadas durante o período que ficou sob a coordenação pelo ex-diretor G S V.
Uma delas é a “mão de vaca”, que consistia em pegar a mão do detento, dobrando-a para dentro, forçando a articulação do pulso, causando dor intensa. Este método quase nunca era utilizado isoladamente. De acordo com os relatos, sempre era com o preso algemado e com a presença de quatro ou mais agentes prisionais, inclusive diante do ex-diretor e do ex-supervisor R F C.
Na técnica “escorpião” o preso era algemado com as mãos para trás e os pés introduzidos no espaço entre os braços fazendo com o que o torturado sofra intensa dor física. Um ex-reeducando relata que sofreu essa tortura e no mesmo dia presenciou outro reeducando sendo torturado com essa técnica o qual ficou na “posição de escorpião” por mais de uma hora sentindo fortes dores.
De acordo com a denúncia, em outra técnica de tortura usada pelos agentes, a “asfixia”, uma sacola plástica era colocada na cabeça do reeducando, deixando-o asfixiado, impossibilitado de respirar, enquanto era espancado com socos e chutes na altura das costelas e dos rins. Em um dos relatos foi denunciado que o próprio diretor chegou a aplicar esse tipo de tortura.
Entre outros tipos de torturas foram relatados também o “apagão” ou “sossega leão” usado para sufocar o reeducando pelo pescoço até desmaiar e em seguida jogando água gelada na cabeça para acordá-lo novamente. A “palmatória”, uma tábua de madeira pesada utilizada em conjunto com outras formas de tortura com o objetivo de aumentar o sofrimento do reeducando, os presos eram agredidos em várias partes do corpo, principalmente na palma das mãos e na planta dos pés causando dores insuportáveis.
Em meio a série de relatos está também o de Josenaldo Vilela Araújo que segundo ele por estar passando mal e insistir em pedir atendimento médico, o agente prisional Leonardo Marques Farias mirou com uma espingarda calibre 12 na região dos seus órgãos genitais e efetuou um disparo. Ferido e com intenso sangramento ele alega que somente após duas horas foi levado à Unidade de Pronto Atendimento (UPA) em Ceres onde fizeram somente um curativo e em seguida levado novamente para a unidade prisional. Após quatro dias ele foi levado para o hospital onde passou por cirurgia. Por fim, ele alega que ainda ficou por trinta dias dentro de uma sela denominada latão, sem colchão, deitado no chão e sem atendimento médico sentindo dores insuportáveis.
De acordo com os relatos, após as sessões de torturas os presos torturados eram levados para o latão com ferimentos onde ficavam por cerca de trinta a noventa dias, sem acompanhamento médico e privado de manter contato com familiares.
Entre as várias denúncias, uma repercutiu em todo o país. Imagens mostram o ex-diretor Guilherme Soares Viera, desferindo quatro disparos de bala de borracha de espingarda calibre 12 contra um detento mesmo este não esboçando nenhuma reação diante da abordagem do diretor. Após os disparos, Guilherme continuou agredindo o detento mesmo já estando imobilizado.
Jovem que teria prestado depoimento ao Ministério Público no inquérito para apurar crimes de torturas foi agredido e ameaçado
Por volta das 02h18 da madrugada do dia 29/11 um jovem sofreu um atentado quando saiu de um espetáculo musical em uma casa de shows. Ele relata que conduzia seu veículo quando de repente foi abalroado de propósito por várias vezes por um VW/Gol de cor branca onde estavam o ex-agente prisional conhecido como Anderson Bocão e seu irmão Matheus de Paula Cordeiro, ex-diretor da Unidade Prisional de Ceres, que a seguir desceram do carro armados com pistolas e o esbofetearam no rosto.
Nas imagens das câmeras de segurança é possível ver que a namorada da vítima, assustada, sai correndo de dentro do carro que ainda estava em movimento. De acordo com a vítima, o celular de sua namorada que caiu no asfalto enquanto tentava sair do veículo, ficou totalmente danificado.
O jovem era reeducando e havia prestado declarações ao Ministério Público sobre a investigação para apurar prática de tortura na Unidade Prisional de Ceres.
Tentativa de homicídio praticada contra reeducando na porta da Unidade Prisional de Ceres
Na noite do dia 08/09/2016, Wallison Nathan Pereira dos Santos de 24 anos foi gravemente ferido, recebendo cerca de quatro disparos de pistola .380 enquanto aguardava sua entrada para dormir no presídio, como de costume. Dois atingiram seus braços e um transfixou seu tórax atravessando os dois pulmões. Wallison foi encaminhado ao Hospital de Urgência de Anápolis em estado grave.
De acordo com a vítima, Wallison cumpria pena em Ceres e estava no regime semiaberto. Os suspeitos de terem praticado a tentativa de homicídio contra Wallison são agentes prisionais que trabalham na Unidade Prisional de Ceres.
Assim, Carlitos Delfino e o advogado Dr. Java, pediram ao Corregedor Nacional de Justiça, Ministro Humberto Martins pela intervenção imediata no caso, com o devido respaldo jurídico. O pedido foi prontamente atendido pelo ministro, o caso agora está sendo investigado pela Corregedoria Nacional de Justiça.